quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Cola líquida

Subiu as escadas correndo, um andar pulado, mais um, de dois em dois.
Quis ignorar qualquer parte escorregadia, molhada pela água que escorrera das portas, que inundara todo o andar, e toda a vila, e todo o espaço, e todo o mar. O mar que ela enxugava com os panos secos.
Tremeu ao pegar o amontoado de chaves que escorregara de sua mão, e girou uma, e outra, e outra vez. Qual era mesmo a chave certa?
Atormentada, telefonou. Reclamou e exigiu respostas, exigiu perguntas, exigiu uma qualquer importância, ou uma qualquer indignação. E a maldita chave que há muito não vira.
Então esperou. Sentou-se em cima de um tapete surrado entre a porta de madeira e as escadas de mármore. Decidiu forçar mais um pouco seu apetite por sono, por música, por tinta. Aliás, havia muita tinta fresca, por todo o corrimão.
Em vão, todo o esforço. Não era ninguém para a audácia da ligação, não era ninguém para qualquer transtorno alheio. E as têmporas voltaram a pulsar.
Ah, quem estava tentando enganar? Depois de todos aqueles jogos de montar sem resultado, e todas as casinhas de construção espalhadas pelo chão sem sucesso...
O vento derrubara tudo, mas por quê? Todas aquelas letras não teriam mais força que qualquer tempestade? Então por que a distância?
Fechou-se em sua mágoa e mordeu toda a chuva reprimida nos olhos. Não queria fazer nada disso, não queria estar sozinha naquele momento. Queria uma mão, uma pálpebra, uma máscara nova, a prova de ouvidos e olhares.

Nenhum comentário:

Postar um comentário