terça-feira, 23 de novembro de 2010

Casualidade de um telefonema escrito.

- É que a gente precisa se encontrar, sabe como é, muito tempo sem conversar me deixa assim, meio arrastada.

- Assim que a sopa esfriar, prometo que chego aí.

- Ah! Não se esqueça do açúcar! Muito açúcar e muita canela.

- Você e essa sua mania... Cuidado com os excessos, menina. E a canela, é mesmo necessária? O gosto já é forte sem ela.

- Gosto mais porque fica exótico. Adoro coisas exóticas.

- Adoro papos sem fim... Assim, filosóficos. Você está assim pra mim, hoje.

- Estou assim, como uma conversa? E sem um fim?

- Está assim, como eu gosto. Por isso que às vezes fico de saco cheio de você.

- Pois então alegre-se: É recíproco!

- Não gosto dessa palavra. Sempre me perco nela.

- Às vezes me perco em palavras também... Mas é nelas que sempre acabo por me achar.

- São tão detestáveis.

- E amáveis, na mesma linha.

...

(E por aí vai)

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Contato

"Somos tão subordinados, por acaso estamos de mãos dadas sem nos conhecer"

Estar sozinha ou rodeada de muita gente em um trem não tem diferença. Ninguém prefere que haja mais um corpo ali.
Não que as queiram mal, eu digo, as pessoas, não as querem mal, não é isso. Apenas esperam que esta ou aquela logo se levante para sentar em seu lugar.
A verdade é que a verdadeira caridade da 'bonita ação para com o outro' não existe, a menos que a verossimilhança esteja como estampa nas caras feias dos demais, coitados, sentados ao lado, julgando todos os 'maus atos', e as 'más vontades', e as 'faltas de ética' que ali se procedem.
Como quando a questão que pára os olhares de todo o vagão é a que envolve ceder o assento àquela senhorinha cheia de sacolas, e tão bondosa.
Diferente de todo o resto dos intrometidos ensaiados.

"Todo dia enfileirados em ordem decrescente de importância social"

O segundo, o da noite passada, cada vez mais remoto.
O terceiro se esvaindo, num desgaste diário de horas contadas e dias curtos.
Alimentando e finalizando a cadeia daqueles mais de quinze carimbados, fotografados e entulhados carinhosamente em uma caixa de sapatos encapada com recortes amarelos, que dão a ela um certo tom nostálgico.
É o tão falado "Começo Do Fim", chegando agora, em passos rápidos.

"Sábios são aqueles que se encontram fora de alcance, preferiram simplesmente se ausentar"

Através de números e truques sortidos, a cor parece vagarosamente voltar para dentro do corpo. E mais que isso.
Até então, inconfessável gesto, mas, é verdade, minhas próprias íris, minhas próprias pupilas, que falam por si, elas não me enganam, nunca me enganam. Nunca me enganaram.

Digo então que te quero bem.
Quero-nos bem, é isso.

"Não se precipite, neste precipício todos vão cair.
Nós não temos medo de cair".

uma idealização.

O tênis vermelho esfarrapado, a camiseta relatando em letras grandes a grande cidade de Nova Iorque. Os braços de veias saltadas terminavam com um grosso livro nas mãos.

- Bonitos óculos. - Ela disse ao menino, ainda a analisá-lo.
- Obrigado.
- O que você está lendo?
- Nietzsche. - e levantou o livro na altura do rosto
A menina sorriu, deslumbrada.
- Estou apaixonada. - E entregou-lhe um post-it com o número do telefone.